Memória Prosaica...
O TOTE MACHADO
(excerto de "O Bite da Francesa")
Jureni Machado Bitencourt
Meu
avô materno tinha um apelido familiar esquisito - : era o Tote. Seu verdadeiro
nome era Antônio Raimundo Machado. Nasceu no povoado de São Gonçalo, do termo
da Piracuruca, no Piauí, no dia 04 de novembro de 1861. Era filho do
ex-presidente da Província do Piauí, José Amaro Machado, e de sua legítima
esposa, Anna Francisca de Miranda Machado.
Pela
ascendência ilustre, deveria ser um privilegiado pela sorte, mas não foi.
Os
pais do Tote Machado foram assassinados por envenenamento, em Teresina, no
mesmo dia em que participavam do banquete de comemoração pelo empossamento de
José Amaro no cargo que corresponde atualmente ao de governador de Estado.
São
escassos os registros históricos sobre aquela tragédia familiar.
Sabe-se
que José Amaro Machado (na imagem à direita) era deputado provincial e pertencia aos quadros do
Partido Conservador. Pela função que exercia como 4º Secretário da Assembleia
Legislativa da então Província do Piauí, poderia, regimentalmente, substituir o
presidente daquela casa em ocasiões de impedimento ou viagens do então titular,
Manoel Joaquim de Abreu, ou de seus secretários substitutos.
Está
claro que na condição de 4º secretário, o deputado José Amaro tinha pouquíssima
chance de ocupar, interinamente, o honroso cargo de presidente da Assembleia
Legislativa do Piauí. Se tal oportunidade era remota (havia três outros
secretários na frente dele), a hipótese de assumir as funções de governante
seria, no máximo, um sonho delirante.
O
que era impossível, terminou acontecendo.
Por
causa dessas situações raríssimas que às vezes acontecem, o deputado José Amaro
Machado estava ocupando, circunstancialmente, o cargo de presidente da Assembléia
quando o presidente da Província do Piauí, Manoel do Rego Barros Sousa Leão
resolveu afastar-se da função.
José
Amaro foi então convocado para assumir, oficialmente o cargo em vacância,
tornando-se governador interino do Piauí.
A
posse foi no dia 27 de fevereiro de 1872.
Em
torno do acontecimento inusitado crepitaram os ciúmes políticos daqueles que
não se conformaram com a situação trazida pelo acaso. A José Amaro foram feitas
inúmeras solicitações de propostas para que recusasse o empossamento, cedendo,
assim, oportunidade para que outro deputado fosse convocado. Compensações das
mais diversas foram oferecidas, mas José Amaro estava mesmo resoluto a ocupar o
cargo.
Assumiu
mas não governou.
Os
insatisfeitos exerceram vingança durante o banquete que na mesma data marcou o
regozijo pela nomeação. Durante o jantar em homenagem ao novo governante, uma
servente, adredemente instruída, ofereceu a José Amaro uma xícara de café
contendo, ao que consta, um fortíssimo veneno. O homenageado aceitou aquela
gentileza recebendo a xícara, mas não sorveu o café, preferindo repassá-lo para
sua esposa. D Anna, que estava sentada ao seu lado tendo ao colo uma criança de
pouco mais de dois anos – a filha caçula de nome Josefina. A esposa não somente
tomou daquele café mortífero como também serviu algumas colheradas à filhinha.
Para desgraça maior, o próprio José Amaro solicitou que lhe fosse servido pouco
depois uma xícara de chá, que também veio envenenada.
Quem
primeiro morreu foi a menina Josefina.
O
óbito ocorreu na madrugada do dia seguinte. Poucas horas depois morreu D. Anna
Machado.
José
amaro que tomara apenas algumas gotas do chá foi acometido por violentas dores
estomacais e acessos de vômitos. Escapou dos efeitos do veneno, mas sucumbiu ao
abatimento de haver perdido a esposa e a filha pequena. Os médicos convocados
para seu atendimento atestaram o envenenamento, todavia sem apontar em que
circunstâncias, se acidental ou criminoso. Recolhido aos seus aposentos,
definhou José Amaro, sem alimentar-se até o dia 16 de março de 1872, quando
faleceu.
Os
filhos órfãos do casal, Domingos, Mathilde, Anna e Antônio Raimundo (o Tote)
foram confiados a um tutor de nome José Florindo de Castro, residente no então
povoado da Batalha.
Não
existem informações sobre a adolescência daqueles órfãos. O tempo
transformou-se no melhor testemunho de que foram bem tratados pelo tutor
Florindo de Castro, em cuja casa receberam carinho e educação.
Quando
atingiu maioridade, o Tote Machado (na imagem à esquerda) procurou profissionalizar-se como
comerciante. Mudou-se para a então Vila de Piracuruca onde se estabeleceu com
um pequeno comércio de tecidos.
Era
um rapaz de boa aparência e de boas maneiras. Vestia-se sempre com muito apuro
e cultivava uma “trunfa”, como no linguajar piauiense se conhece o topete alto das
cabeleiras masculinas.
Elegante
e “trunfado”, o Tote Machado passou a namorar uma das filhas do tenente coronel
da Guarda Nacional, Gervásio de Britto Passos, também deputado provincial pelo
Piauí. A moça chamava-se Maria Joanna mas todos a apelidavam carinhosamente com
o nome de Mariquinha Moraes.
Cumprindo
o hábito tradicional da época, o Tote Machado pediu por escrito, a mão de
Maroquinha em casamento no dia 2 de agosto de 1884.
Ilmo.
Sr. Ten. Cel. Gervásio de Britto Passos.
Um
sentimento de coração me faz ir à presença de V. Sª para, por meio desta, pedir
a mão de sua digna filha, a Exma. Srta. D. Maria Joanna de Moraes.
Certo
de que V. Sª dará a necessária atenção a esta minha pretensão de casamento,
aguardo sua respeitável resolução para meu governo.
Com
alta estima e consideração, assino-me
De
V. Sª amigo e respeitador
Antônio
Raimundo Machado
O
pai da moça não tardou em dar a resposta solicitada. No dia seguinte, 3 de
agosto de 1884, o Ten. Cel. Gervásio de Britto Passos encaminhou ao Tote a seguinte
missiva:
Ilmo.
Merecidíssimo
Antônio
Raimundo Machado
Sua
estimada carta datada de ontem me foi entregue e respondo.
Teve
sua referida carta por fim, pedir a casamento minha filha Maria a quem dei
conhecimento do seu desejo; e tendo sido aceita a sua proposta não só por ela
como pela minha família, fica assim, V. Sª satisfeito, tanto mais quanto
aprecio as suas qualidades.
Quanto
ao tempo para a realização deste negócio, combinaremos verbalmente.
Desejo-lhe
saúde e sem mais. De V Sª, amigo atencioso.
Gervásio
de Britto Passos.
Com
mais de um século guardada, a carta-resposta original assinada pelo pai da
noiva desparta risos pelo uso da palavra “negócio” referindo-se ao casamento. É
que o coronel Gervásio que também foi senador pelo Piauí no começo da
República, era homem de poucas letras e frequentemente desancava o vernáculo
acunhando palavras onde não devia.
Mas,
o “negócio” do casamento do Tote Machado foi celebrado, realizando-se a união
dos noivos no ano de 1885.
Recém-casados,
Tote e Mariquinha foram residir na fazenda Santo Amaro, situada nas
proximidades do povoado Batalha. Ali nasceu o primogênito do casal, no dia 26
de abril de 1886. A criança foi batizada com o nome de José mas não resistiu a
uma enfermidade. Faleceu no dia 5 de fevereiro de 1887.
O
falecimento da criança deve ter influenciado bastante na decisão do casal em
voltar para o ambiente da Vila de Piracuruca naquele mesmo ano. Mariquinha
necessitava do consolo familiar, sobretudo do carinho da mãe, D. Carlota Maria
de Morais, conhecida pelo apego aos filhos. D. Carlota faleceu em 14 de agosto
de 1890.
A formação da família do Tote foi por ele
mesmo documentada numa caderneta de anotações.
No
dia 26 de abril de 1886 nasceu meu filho José, em Santo Amaro da Batalha.
Batizou-se em Piracuruca no dia 7 de julho do mesmo ano. Faleceu em 3 de
fevereiro de 1887.
Nasceu
minha filha Adelaide no dia 1º de abril de 1888, em Piracuruca. Batizou-se no
dia 24 de junho do mesmo ano, sendo padrinhos Felix Dias de Miranda e minha
mana D. Anna Machado.
Nasceu
meu filho Luiz Gonzaga “Sinhozinho” no dia 21 de junho de 1891, e batizou-se no
dia 28 de julho do mesmo ano. Foram padrinhos meu tio Antônio Guilherme e minha
mana Josefina.
Nasceu
meu filho José – “Zeca Machado” – no dia 9 de setembro de 1895. Batizou-se no dia 7 de dezembro do mesmo ano.
Foram padrinhos Antônio de Britto Melo e sua mulher, D. Leonizia de Morais
Britto.
Nasceu
minha filha Benedita (N. A. – “Bebita”) no dia 12 de novembro de 1898.
Batizou-se no dia 23 de abril de 1899, sendo padrinhos Luiz de Britto Melo e D.
Vicencia de Morais Britto.
No
dia 6 de marlo de 1901 nasceu meu filho Olegário (Seo Lega). Foram seus
padrinhos Anisio de Abreu, representados por Adelino Melo e minha mana
Mathilde.
Nasceu
minha filha Francisca “Francy” no dia 7 de junho do 1903. Batizou-se no dia 24
de setembro do mesmo ano, sendo padrinhos meu sogro, ten. cel. Gervásio e minha
mana “Donana” Machado.
Nasceu
minha filha Raimunda “Didi” em 25 de agosto de 1905. Batizou-se em 18 de
novembro do mesmo ano. Foram padrinhos meu genro Álvaro Mendes e sua esposa,
minha filha Adelaide.
O
nascimento de Raimunda, chamada familiarmente por Didi, encerrou a prole.
Durante
a formação da família de Tote Machado, ocorreram grandes fatos, como a abolição
da escravatura, a derrubada do Império e a elevação da Vila de Piracuruca à
condição de cidade.
Elegeu-se
como primeiro prefeito (intendente) da Piracuruca o primogênito do
tenente-coronel Gervásio de Britto Passos, de nome Pedro Melchíades de era,
portanto, cunhado de Tote Machado.
Como
não poderia deixar de ser, em obediência aos modismos da época, Antônio
Raimundo – o Tote – também adquiriu patente de oficial superior da Guarda
Nacional, tornando-se tenente-coronel. Comprou espada, dragonas e uniformes,
antes mesmo de possuir uma residência para morar. Apesar de ter sido abastado
comerciante, dono de fazendas e criador de gado, o Tote Machado protelou,
durante muitos anos, a construção da casa própria. Viveu durante muito tempo
num casarão situado nas proximidades do antigo mercado livre da Piracuruca, que
ficava no prolongamento dos terrenos de fundo da igreja de Nossa Senhora do
Carmo. Em épocas ainda mais remotas, ali existiu um cemitério destinado ao
sepultamento de pagãos e de suicidas. Com o passar dos anos, aquele necrotério
desapareceu e em seu lugar construiu-se a praça que tem o nome de Getúlio
Vargas. O casarão onde o Tote Machado residiu e teve sua loja ficava na esquina
onde se instalou, mais tarde, o tabelião Lucas Vieira, com o cartório que tem o
seu nome.
A
residência definitiva do Tote Machado (na imagem à direita) foi por ele construída na boca da estrada
que demandava ao sítio Olho D’água, do Padre Máximo Martins Ferreira. Segundo
as anotações feitas de próprio punho pelo Tote, a construção foi iniciada a 2
de novembro de 1909 e terminada no dia 18 de novembro de 1910, custando a
quantia de quinze contos de réis.
A
casa do coronel Tote, de Piracuruca, ainda existe e mantém as características
arquitetônicas do seu tempo. Com o passar dos anos, serviu como sede do extinto
Cassino 16 de Julho, foi seda da Prefeitura Municipal de Piracuruca e abrigou
diversos órgãos de Governo. Atualmente, a loja pertence à superintendência do
Sersom – Serviço Social do Município.
Essas
referências memoriais sobre a residência do Tote Machado têm como objetivo chamar
atenção para um fato relevante da própria história da cidade de Piracuruca.
Naquela casa centralizaram-se os atos de reação política da sociedade
piracuruquense contra o Bispado do Piauí, por ocasião da célebre Questão da
Santa.
O
que aconteceu foi o seguinte:
Desde
1906 era Bispo do Piauí, Dom Joaquim Antônio D’Almeida. Em viagem pastoral que
realizou a Piracuruca, aquele prelado tomou conhecimento da existência de uma
herança deixada pelo português Manoel Dantas Correia para a santa padroeira do
lugar, Nossa Senhora do Carmo. A herança era constituida por nove fazendas de
gado, de cujas rendas eram obtidos os recursos financeiros para a manutenção da
igreja local e do respectivo orago carmelita que se pratica no mês de julho,
tradicionalmente.
Por
entender que na condição de Bispo do Piauí, tinha prerrogativas de administrar aquelas
rendas, Dom Joaquim D’almeida passou a transferir para Teresina (e por lá
vender) os objetos pertencentes ao patrimônio da santa. Esses atos –
justificava o Bispo – destinavam-se à captação de dinheiro para o pagamento das
obras de construção do Seminário Diocesano e do Palácio Episcopal.
Inicialmente,
a população aceitou aquelas ações episcopais sem reclamações ou protestos mas
quando Dom Joaquim D’Almeida resolveu vender a terceiros as terras de Nossa
Senhora do Carmo, encontrou cerrada e decidida oposição do Povo de Piracuruca.
É
que nos termos do testamento de Manoel Dantas Correia – os bens deveriam ser,
para sempre, inalienáveis. Jamais poderiam ser vendidos ou transferidos para
terceiros. As rendas – auferidas com a multiplicação dos rebanhos e uso do solo
– essas sim, poderiam ser comercializadas em benefício da Igreja e, sobretudo,
da manutenção dos festejos anuais do mês carmelita. Administrava aquele espólio
uma instituição de nome Fraternidade Piracuruquense.
O
Bispo Dom Joaquim D’almeida resolveu interpretar de forma diferente os termos
do testamento de Manoel Dantas e autorizou a expropriação das fazendas e
rebanhos, mandando para Piracuruca um agente procurador de nome Agostinho
Basilio Alves, com o objetivo de vender aqueles bens.
Deu-se
mal o Agostinho Basilio.
O
procurador do Bispo foi impedido de retirar os rebanhos das fazendas da santa e
terminou sendo expulso da cidade, debaixo de vaias.
Liderou
a manifestação de desagrado o então deputado provincial, Antônio Raimundo
(Tote) Machado que havia sido eleito para ocupar o espaço deixado por Gervásio
de Britto Passos na Assembleia Legislativa do Piauí. O cel. Gervásio, sogro do
Tote, era então senador da República.
A casa
do Tote Machado foi o local onde se reuniram os manifestantes antes da operação
“bota-fora” para a expulsão do procurador episcopal Agostinho Basilio.
Munidos
de zabumbas, latas velhas e chocalhos, os manifestantes fizeram, inicialmente,
uma passeata pelas ruas da cidade. Depois, concentraram-se na Praça Irmãos
Dantas, em frente à Igreja de Nossa Senhora do Carmo. Para aquele mesmo local
foram levados os burros de montaria e dem”matalotagem” do inditoso Basilio. O
procurador do bispo era, então, hóspede do comerciante José Mendes da Rocha.
Para
grande desgosto e constrangimento daquele fidalgo anfitrião, os animais haviam
sido retirados sem permissão de uma quinta da sua propriedade, onde estavam
guardados.
O
pior aconteceu em seguida.
Um
emissário dos manifestantes veio intimar Agostinho Basílio para retirar-se,
imediatamente, da cidade.
Não
houve como evitar a humilhação. Profundamente chocado com o que acontecia com
seu hóspede, José Mendes da Rocha dispôs-se a acompanha-lo até fora da cidade e
o fez submetendo-se ao achincalhe de troças, vaias e insultos. O fato aconteceu
no dia 7 de julho de 1909.
Dom
Joaquim D’Almeida denunciou o fato às autoridades do Governo. Esperou, em vão,
por providências (que não aconteceram!) e inconformado recorreu às páginas do
jornal O APÓSTOLO, de Teresina, para denunciar uma fantasiosa rebelião anárquica
que estava em gestação na cidade de Piracuruca, sob o comando do deputado Tote
Machado e sob patrocínio da Maçonaria.
As
denúncias do bispo foram respondidas na edição de 3 de agosto de 1909. Num
artigo assinado sob o título “Pela Minha Honra”, o deputado Tote Machado defendeu-se
das acusações e desmentiu a existência de tal revolta piracuruquense.
A “Questão
da Santa” transformou-se num dos mais famosos processos jurídicos do Tribunal
de Justiça do Piauí. A polêmica travada entre os advogados das partes ocupou
muitas páginas de jornais. Não houve propriamente uma sentença para o caso.
Depois de quase trinta anos de embargos e desembargos, a questão foi encerrada
num acordo entre as partes. Comprometeu-se o Bispado do Piauí a preservar a
inalienação dos bens da santa Nossa Senhora do Carmo. Quando o acordo foi
firmado, Dom Joaquim D’Almeida e o Tote Machado já haviam falecido.
As
duas últimas décadas da vida do Tote Machado foram dedicadas à política
partidária liderada pelo senador (e sogro) Gervásio de Britto Passos. Essa fiel
militância significou, de certa forma, seu afastamento dos negócios das fazendas
e dos carnaubais, de que resultaram prejuízos.
Em 1911,
por exemplo, enquanto o Tote Machado empenhava-se nos debates da “Questão da
Santa”, suas fazendas sofreram uma perda de 400 rezes. Em 1912, conforme suas
próprias anotações numa caderneta de apontamentos “... o gado quase se extingue,
pois foi grande a mortandade dos bezerros...” em 1914, forçado pelas
circunstâncias do empobrecimento gradual e persistente, o Tote Machado viu-se
obrigado a comercializar... rapaduras. Em 1915, a crise não foi apenas dele,
mas de toda a população piracuruquense. No final daquele ano ele anotou na sua
caderneta que “... era triste o estado de miséria...”
O
ano de 1916 foi diferente. Refletiu-se no Piauí e na pequenina Piracuruca as
consequências da guerra que se desenrolava na Europa. Os importadores
internacionais passaram a comprar grandes quantidades de cera de carnaúba. A necessidade
de transportes de cargas evidenciou, naquela época, a importância de uma
ferrovia que o então governo da República (Wenceslau Brás) prometia ao Piauí,
para unir os municípios de Amarração (atual Luis Correia) e Campo Maior. No
traçado dessa ferrovia incluía-se o território da Piracuruca. Pelo apressamento
na construção dessa estrada de ferro manifestou-se o venerável senador Gervásio
de Britto Passos, já no ocaso da sua existência.
Em
1917, o Tote Machado registrou no seu caderno de apontamentos a ocorrência de
uma grande cheia no rio Piracuruca e, com essa, a derrubada de muitas casas. O
texto é explícito:
Durante
os trinta anos que aqui resido, nunca tinha visto o rio Piracuruca com igual
porção d’água. Morreu muita gente de febre palustre, especialmente os cearenses
que para este Estado emigraram.
A
presença dos cearenses em Piracuruca tinha uma explicação além das
consequências do flagelo das secas e das enchentes. Noticiava-se que o novo
presidente da República, o paraibano e nordestino Epitácio Pessoa iria
autorizar (como de fato o fez) a construção do ramal ferroviário unindo as
cidades piauienses de Amarração (atual Luis Correia) e Campo Maior. A boa
notícia evidenciava que naquele ano haveria uma excelente oferta de emprego
para “casacos” nas obras de construção da estrada de ferro. Potencializava-se
uma transformação econômica episódica nos ermos do norte piauiense pelo aporte
de grandes recursos financeiros a serem gastos na compra de materiais e com o
pagamento de milhares de trabalhadores.
Assim
aconteceu.
Dizendo-se
também atraído pela boa notícia do começo de 1919, apareceu naquele ano na
Piracuruca um senhor gordo a comandar um tropel de burros carregados com
mercadorias diversas. Dizia-se oriundo de Chapadinha, do Maranhão.
Procurou
o cel. Tote Machado e apresentou-se.
Era
o major Antônio Pereira de Sousa Melo.
(BITENCOURT, Jureni
Machado. O Bite da Francesa. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 1999; p.
35-46).
Teve outro filho também. Era meu bisavô.
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