Memória Prosaica...
CARTA PARA EL-REI - 1741[1]
Dom Frei Manuel da Cruz
Senhor,
Por
Vossa Majestade servido por resolução expedida da Mesa da Consciência e Ordens em
20 de maio de 1740 criar de novo na freguesia da vila da Mocha mais duas
freguesias[2]
com párocos colados, uma na ribeira da Gurguéia, e outra no distrito da
Caatinguinha, como também foi servido criar, e erigir mais em novas vigararias
coladas[3]
os curatos[4]
das igrejas de Santa Maria da Vila do Icatu, Nossa Senhora do Carmo de
Piracuruca, Santo Antônio do Surubim, Nossa Senhora de Nazaré do Mearim, Nossa
Senhora da Conceição das Aldeias Altas e Nossa Senhora do Livramento de
Parnaguá (que são únicos curatos amovíveis que por esta hora há neste bispado)
consignando anualmente a cada um dos vigários destas freguesias, cem mil-réis
de côngrua[5]
pagos pela sua Real Fazenda, e porque nela não há sobejos com que se possam
pagar estas côngruas, me pareceu preciso recorrer a Vossa Majestade para que à
vista deste inconveniente determine o que for servido, pois não me parece justo,
que os opositores se oponham a tais igrejas com a esperança de terem de côngrua
cem-mil réis, e não se lhe pagarem por não haver dinheiro no Almoxarifado; como
não há ainda para outras despesas muito mais precisas.
Está
a vigararia colada do Itapicuru sem igreja matriz há muitos anos, não obstante
ser servido Vossa Majestade mandar que fizesse a tal igreja à custa da Fazenda
Real; e vendo eu em visita esta gravíssima falta (pois se está dizendo missa em
uma capelinha coberta de palha, que fizeram uns devotos) instei repetidas vezes
ao provedor da Fazenda Real, que desse a execução às ordens de Vossa Majestade
mandando fazer a dita igreja, e me respondeu que não havia dinheiro, e que
disto mesmo dava conta a Vossa Majestade. Na freguesia de Nossa Senhora da
Conceição das Aldeias Altas também não há igreja matriz e como a freguesia é
pequena, e os moradores pobres, recomendei ao cura que pedisse esmolas para
fazer a igreja; o que tem feito, porque é zeloso; mas ainda assim duvido, que
se faça a igreja sem alguma ajuda de custo da Fazenda Real. Na freguesia Mearim
também não havia igreja matriz, e agora se anda fazendo a custa de uma doação
que Sua Majestade [corroída 1 palavra].
Em todas as igrejas desta comarca vi em visita a grande necessidade que tem de
paramentos, porque alguns poucos que têm são provectos, e são indignos, e
incapazes, e o mesmo sucede nas igrejas do sertão, como me tenho informado de
pessoas fidedignas; o que sem dúvida procede de não terem côngrua alguma para a
fábrica, por cujo motivo tenho representado a Vossa Majestade seja servido
mandar cominar na Fazenda Real côngruas para a fábrica de todas as igrejas
deste bispado que estão eretas e se hão de erigir pelo tempo adiante na forma
que a têm todas as igrejas do arcebispado da Bahia.
Todas
estas despesas, Senhor, são tão precisas que há nelas gravíssima obrigação; e
por hora nenhuma há para erigir vigarias coladas, ainda que será bem feito que
pelo tempo adiante ao mesmo passo, que forem crescendo as rendas do bispado se
não erijam vigarias coladas; e ainda nestas devem preferir aqueles curatos, que
por mais pobres necessitam os seus párocos de côngruas, de que eu irei dando
conta, o provedor da Fazenda Real a deve dar dos acréscimos das rendas, para
assim se veja, e se conheça, que curatos é quantos, se podem criar em vigarias
coladas. Nem pareça novo nesse arbítrio; porque do mesmo se usa no arcebispado
da Bahia; e nos bispados do Rio de Janeiro e Pernambuco, em que há curatos
amovíveis, não obstantes serem os tais bispados mais ricos e possantes. Este
bispado está ainda muito no seu princípio, e com pouca renda e assim é
necessário por hora acudir as despesas mais precisas, e depois se cuidará nas
de menor necessidade, porque para tudo espero em Deus hajam rendimentos para
Vossa Majestade ser servido mandar distribuir com aquela grande piedade, real
magnificência que costuma. Vossa Majestade determinará o que for servido etc.
[1]Carta de d. Frei
Manuel da Cruz, bispo do Maranhão e Mariana, ao rei de Portugal, d. João V,
comunicando a criação do curato da igreja de N. S. do Carmo de Piracuruca e de outras
sob sua diocese, bem como solicitando recursos para sua manutenção (n. de
Augusto Brito);
[2]A freguesia, ainda
hoje, é a menor divisão administrativa em Portugal e corresponde à paróquia
civil em outros países. O Brasil, enquanto fez parte do antigo Império
Português, também era composto de freguesias (n. de Augusto Brito).
[3]O vigário colado era
um cargo ocupado por um sacerdote que, mediante nomeação, passava a assumir, em
caráter permanente, uma paróquia canônica. Isso se dava no sistema de padroado,
em que a Igreja Católica e o Estado compartilhavam responsabilidades na administração
da vida religiosa e civil (n. de Augusto Brito).
[4]As aldeias ou povoados
que possuíam as condições necessárias para se tornarem uma paróquia eram
chamados curatos. O nome deriva de “cura” ou padre (n. de Augusto Brito).
[5]A côngrua era o
salário a que tinha direito o vigário colado, pago pelo Estado, a partir dos
dízimos recolhidos junto aos fiéis pelo poder público (n. de Augusto Brito).
Nenhum comentário:
Postar um comentário